sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Pausa Cult : Donnie Darko

Fala-se muito sobre grandes filmes, e com razão. Mas e os grandes momentos perdidos em filmes medianos ou apenas bons?

Donnie Darko foi a primeira aventura de direção de Richard Kelly, um escritor de roteiros. Não foi um sucesso – ele teve que voltar a escrever para os filmes de outros por anos até ter outra chance. Mas apesar de dar prejuízo no lançamento, ganhou rapidamente uma platéia mundial que se identificou com a trama ilógica, a trilha sonora perfeitamente escolhida e os mindfucks do estilo. Trata-se, afinal da história de um adolescente perturbando, seu amigo (um coelho-demônio) e o fim do mundo.

Resultado: assim como os Engenheiros do Hawaii, Kelly passou a ser adorado por uma minoria entusiasmada e odiado visceralmente pelo resto do mundo ocidental. De qualquer forma, Donnie Darko vale ser assistido, nem que seja para que você finalmente escolha seu lado.

A cena de introdução da escola é, talvez, uma das mais belas da década que passou; um panning que alterna entre lento e rápido, da entrada do prédio até o pátio, namorando o cenário e os personagens da vida adolescente: o parasita valentão, os losers sem amigos pelos cantos, as rodinhas de colegas, a professora fanática por slogans baratos de auto-ajuda, a fofoca e as trocas de olhares do corpo docente, a doçura desajeitada das meninas treinando passos de dança. Tudo encaixado sem incidente na trilha sonora, com sincronia magistral. Exageros, sim (o delinqüente oficial dando cafungadas no meio do corredor? Drew Barrymore e seu vácuo cranial como professora de qualquer matéria?), mas deixemos os documentários para Michael Moore: quando se trata de ficção, muitas vezes a caricatura é o retrato mais honesto possível da realidade.

Agora a parte chata: falar mal. Os enólogos dizem que se você adicionar uma gota de vinho fino em um barril de merda você tem um barril de merda. Caso adicione uma gota de merda em um barril de vinho fino...você obtém um barril de merda. E existe uma gota de lodo na mistura de Donnie Darko que não pode ser negada, nem relevada.

Filmes são por definição meios autocontidos. A apresentação precisa dar ao espectador os instrumentos básicos para poder entrar na história de forma consciente: personagens, contexto, ritmo, definições. Donnie Darko escolhe não fazer isso; sem ler o site do filme e as longas explicações do diretor, uma parte central da história fica sem explicação, uma charada cuja resposta não faz sentido.

O roteiro, para ser entendido, depende de elementos que não apenas são exageradamente sutis – muitos dos elementos nem sequer estão nos 113 minutos do filme. É como vender um quebra-cabeças com 10% das peças faltando; não é mistério, é trapaça.

Pior: talvez essa muleta, a parte ruim, seja o verdadeiro Kelly. Seu filme mais recente, Southland Tales, é talvez a melhor comédia não-intencional já produzida: um tijolo de mais de duas horas de teorias conspiratórias, ideias fora de lugar e excesso de estilo com substância duvidosa, que precisam de um livro à parte para serem compreendidas e mesmo assim não convencem.

A grandeza às vezes é mero acidente.

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